Africanidades: um roteiro histórico pela Ouro Preto Negra

Como identificar as marcas da presença negra nos espaços culturais de Ouro Preto? Este roteiro não é turístico.

A história oficial tentou apagar a população negra nas construções históricas da cidade de Ouro Preto, mas essa população deixou marcas. 

Estou parada em frente a igreja do Rosário esperando o roteiro começar. O projeto Africanidades: um roteiro pela Ouro Preto Negra é coordenado pela professora Janete Flor de Maio Fonseca (DEETE/NEABI), junto aos estudantes de História, Alexia Leles de Castro, Liriel Alves Barbosa, Luana Brunely da Silva e Vittor Policarpo Souza Martins. A proposta é realizar um passeio pelo centro da cidade de Ouro Preto, identificando as marcas da presença negra nos espaços de trabalho, lazer, religiosos, culturais, etc.

Após apresentação, começamos os caminhos pela cidade. Há muito tempo existe a mobilização da população negra de Ouro Preto para reconhecimento de suas histórias. Lideranças do samba, congado e umbanda, preservam a memória e a corporalidade negra.

Pensar a história negra é ampliar o diálogo com a comunidade. Ressignificar. É entender que a história, por exemplo, de indivíduos escravizados (seus nomes, suas lutas) são apagadas de forma intencional. Neste roteiro, os participantes entram em contato com o passado.

Ouvimos sobre o caminho do tronco e a região da mineração, com as técnicas e ferramentas africanas utilizadas nas minas. Os Mundeus (casas em cima de estruturas de pedra). A presença de negros livres e libertos nas profissões de artistas, enfermeiros, artesãos, ferreiros, carroceiros, açougueiros, músicos e inúmeros outros cargos.

Pude ver a cultura negra dentro das igrejas e escutar sobre a Irmandade das Mercês e a Irmandade do Rosário. Algumas igrejas tem em seus cantos anjos pardos e negros, e também símbolos Adinkras, que pertencem ao povo Ashanti, localizados em países da África Ocidental. Apesar dos processos das diásporas africanas, a tecnologia ancestral permanece viva.

Ao longo do caminho, soube da ligação entre as estruturas dos chafarizes (cruzes em formato de tridente) com Exu. Sobre os "Tigres", que eram escravizados estigmatizados que carregavam os dejetos da população. Mas não era regra, muitos dejetos eram jogados na rua.

Passamos pelo Largo da alegria e a rua dos comércios, onde refletimos sobre as mudanças e as permanências. A música e a capoeira. Os sinos e o exílio periférico. 

Ao subir a rua direita, repleta de turistas brancos, encontrei estabelecimentos com nomes que remetem a escravidão. Hotel Colonial e Restaurante Calabouço. Lugares que vendem a experiência daquela época. Olhares dispersos, falas desencontradas, uma Tiradentes marcada pelo apagamento da história negra. O palco para shows sendo construído...

Existiu um pelourinho na feirinha de artesanato, que já foi estábulo, mercado e agora praça de artesanato. Tantas histórias, vários nomes. 

O roteiro acaba na Igreja de São Francisco. Observo atentamente. A obra prima de Aleijadinho me marca. As africanidades são transpassadas na formação de artistas negros que passaram por aqui. Quero ver uma Ouro Preto cada vez mais negra e africana, para isso preciso transformar meu olhar.

Fugir um pouco do centro. Conhecer os bairros distantes. Visitar outras ruas.

Propor novos imaginários sobre a história negra.

Arquivo Pessoal
Imagem de arquivo pessoal

Contato do projeto: proj.presencanegraop@ufop.edu.br

Redes Sociais: @negros.ouropreto

Texto: Jeane Polva